Pecuária neutra traz desafios, mostra estudo
Fazenda australiana testa inovações para reduzir as emissões de gases de efeito estufa
A Jigsaw Farms, uma fazenda pecuária na Austrália, é pioneira no combate às mudanças climáticas. Localizada a 250 quilômetros de Melbourne, ela obteve o selo de carbono neutro em 2011. Hoje, com 20 mil ovelhas da raça merino de lã fina e 550 bovinos, a propriedade não consegue mais compensar suas emissões de gases de efeito estufa (GEE).
Conforme reportagem do jornal The Guardian, as vacas e as ovelhas produzem a mesma quantidade de metano anualmente, mas as árvores perdem capacidade de sequestrar o elemento à medida que envelhecem.
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Para atingir a neutralidade, os proprietários da Jigsaw Farms mesclaram pastagens com plantações de eucalipto, interligadas por zonas úmidas e corredores de floresta nativa, incentivando a biodiversidade. Juntamente com uma metodologia de cuidado do solo, essas medidas ajudaram a sequestrar carbono e neutralizar as emissões da produção pecuária na propriedade de 34 km².

No entanto, isso foi eficaz apenas até 2017, quando um novo relatório revelou que a fazenda emitia mais GEE do que conseguia sequestrar.
Até mesmo o solo da propriedade, que recebeu gramíneas com raízes profundas para aumentar a eficiência no sequestro de carbono, já não é capaz de absorver mais nada da atmosfera. Os dados são de Richard Eckard, professor e pesquisador da Universidade de Melbourne, que elaborou um estudo sobre a fazenda.
De acordo com a pesquisa, a Jigsaw Farms sequestrou de 70,3% a 83% de suas emissões anuais em 2021. Em 2031, o modelo de Eckard prevê que a fazenda absorverá pouco mais da metade do que absorveu em 2012, quando o sequestro de carbono atingiu seu pico.
Estratégias para diminuir as emissões
A Jigsaw Farms utilizou a Holdfast GT Phalaris, uma grama desenvolvida por cientistas australianos, e centeio em seu pasto. Essas espécies possuem um ciclo de vida mais longo e pertencem ao grupo de plantas perenes. Suas raízes, quase dez vezes mais profundas do que as da relva típica, permitiram uma maior captura de carbono.

As plantas perenes formam relações simbióticas mais fortes com bactérias e fungos, reduzindo a erosão e absorvendo mais carbono do que as plantas anuais. Além disso, facilitam a gestão, evitando a necessidade de semear e limpar o terreno com frequência.
Outro ponto positivo das plantas perenes é que, ao selecionar espécies com raízes de diferentes tamanhos, elas conseguem absorver minerais das profundezas do solo, melhorando a dieta animal. O nitrogênio que absorvem do ar também atua como um fertilizante natural, diminuindo a dependência de químicos artificiais no solo.
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No entanto, como observado no caso da Jigsaw Farms, elas não são suficientes para neutralizar as emissões da pecuária. Portanto, o setor estuda formas de reduzir o metano emitido pelas vacas, responsável por 80% das emissões. O uso de máscaras no gado, para filtrar os gases na eructação (arroto), e a seleção de bovinos com crescimento mais rápido estão entre as iniciativas consideradas pelos especialistas.
Essas medidas podem reduzir o tempo de emissão de metano ao longo da vida do rebanho. Outra opção é a produção de ração bovina com algas marinhas, para melhorar a digestão do gado. Estudos em laboratório indicam uma possibilidade de redução do metano em até 80%, mas um teste de campo na Austrália conseguiu uma redução de 28% em 2023.