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Agro de baixo carbono no Brasil ganha força na COP 28

O executivo da ONG Amigos da Terra, Pedro Burnier, fala sobre o agro de baixo carbono, que ganhou destaque na COP 28

Redação

em 15 de dezembro de 2023


Pedro Burnier, diretor de programa agropecuária da ONG Amigos da Terra – Amazônia Brasileira, foi um participante ativo da COP 28 na comitiva oficial do Brasil. Nessa entrevista ao Prato do Amanhã ele fala dos principais temas em que participou ou teve contato durante a conferência realizada em Dubai. O especialista acredita no avanço da rastreabilidade animal como positiva para a mudança de imagem do Brasil e, inclusive, como ferramenta de aumento de produtividade dos pecuaristas. Burnier fala ainda do relacionamento entre Brasil e China na área de agronegócios e dos financiamentos para a transição para um mercado agro de baixo carbono. 

Como foi a participação dos Amigos da Terra na COP 28?

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A razão de termos ido à COP 28 foi para participar de várias discussões, integrando a comitiva brasileira. Nesse sentido, participamos de painéis na programação do estande oficial do país. Juntamos várias propostas temáticas, da agricultura de baixo carbono à segurança alimentar. Nós juntamos essa indicação com a de outras instituições e eu fui um dos painelistas. Convidamos várias pessoas para participar da discussão, entre eles o Ricardo Negrini, do Ministério Público Federal (MPF), que é um órgão importante para o cumprimento da TAC (termo de ajustamento de conduta) da Carne, não só no Pará, mas em outros estados. Falamos bastante de acessibilidade nesse painel e mesmo do rastreamento individual de rebanho. Como coordenamos o Grupo de Trabalho dos Fornecedores Indiretos (GTFI), eu também representei essa iniciativa nas discussões em Dubai. 

Por falar em rastreabilidade, como o tema foi debatido nesse painel?

Falamos muito da rastreabilidade em lote, porque a individual é importante, mas ainda vai demorar para avançar. No rebanho brasileiro, ela não chega a 2% e não atinge 4 milhões de cabeças. O tema, no entanto, está ligado à pecuária de baixo carbono, que foi outro debate em paralelo do qual participamos no espaço chamado de Amazon Hub. Foi importante porque vários governadores da Amazônia participaram desse espaço de discussão. Inclusive, o Helder Barbalho, governador do Pará, lançou o programa de rastreabilidade individual do estado no Amazon Hub. O lançamento é interessante porque daqui a dois anos Belém vai sediar a COP 30.

O que você destaca dessa iniciativa?

Um dado importante é que o Fundo Bezos, que fez parte da discussão no Amazon Hub, faz parte da iniciativa do Pará e vai ajudar a financiar o programa, o que demonstra uma maturidade da iniciativa. O rastreamento da cadeia bovina foi um dos temas mais discutidos na COP 28 e faz sentido, porque a cadeia bovina – assim como a produção de soja – são dos dois drivers de desmatamento no Brasil.  

Com a finalização da COP 28, Belém tem que avançar em muitas frentes para sediar o evento em 2025. O que fazer nesses próximos dois anos?

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Foto: Igor Nascimento – ASCOM SEMAS/Agência Pará

Primeiro vamos ter que ter muitas atividades e muitos projetos ligados ao tema desmatamento, demonstrando resultados. É o caso desse programa do Pará, onde o estado se compromete a ter todo o gado rastreado individualmente até o final de 2026. Até 2025 todos os animais que nascerem no período que antecede a COP 30 deverão ser identificados e a cadeia completa de produção seria rastreada até o fim de 2026. É um programa ousado. 

Há outras fontes de financiamento?

Sim. O presidente do BNDES também comunicou o lançamento de um fundo para restauração da Amazônia, envolvendo R$ 450 milhões não reembolsáveis. Além de 500 milhões a juros de 1%. . Ou seja, novamente há uma disponibilidade de dinheiro exatamente para os estados da Amazônia possam avançar até a COP 2025. Estamos falando de um fundo para restauração ambiental, recuperação das áreas desmatadas 

Parece que houve uma aproximação entre Brasil e China na questão de desmatamento e de rastreabilidade da produção de carne…

Sim. Participei de um diálogo Brasil-China sobre desmatamento. Foi um evento paralelo que basicamente envolveu várias ONGs dos dois países. A China está muito mais preocupada com food security e food safety, segurança alimentar e segurança de alimentos, do que em adotar uma visão punitivista para a questão do desmatamento. Ela quer ter a certeza de que os alimentos não estejam contaminados e garantir fornecedores que entreguem a comida no prato da população chinesa.  Representantes do Mato Grosso e do Pará também participaram de discussões com representante da China no Amazon Hub .

Mas temos ainda a questão das diretrizes europeias, né?

Elas acabam sendo exemplo e os chineses em algum momento também terão protocolos ou alguma restrição com relação aos atributos que vão contra a sustentabilidade, ou seja, com a origem da carne que venha de região desmatada. O grande problema da restrição europeia está na produção do couro, que tem cerca de 25% indo para o mercado externo, inclusive para a Europa. É mais importante do que a exportação de carne para os europeus, que chega a 6%. No caso do couro, uma importação restrita de produto brasileiro pode ter grande impacto. A conversa com os chineses mostrou que eles preferem trabalhar com uma agenda mais positiva, ajudando a conseguir financiamento para ajudar os produtores e o mercado brasileiro a fazer uma boa rastreabilidade e ter uma pecuária  de baixo carbono, além de  uma pecuária sem desmatamento. 

O que você espera da COP 30?

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Foto: Ricardo Stuckert/PR

Um avanço na discussão sobre rastreabilidade de fornecedores diretos e indiretos. Ter a totalidade da cadeia rastreada é uma forma de ajudar a coibir o desmatamento. Isso deixou de ser uma conversa apenas da sociedade civil, mas está sensibilizando toda a cadeia da pecuária brasileira. A agricultura de baixo carbono é outro tema, assim como o mercado de venda de crédito de carbono. Além disso, a questão do financiamento vai ficar cada vez mais premente, porque as instituições financeiras poderão ser cobradas por fornecer crédito a quem desmata,  contribuindo indiretamente para o desmatamento.