PRETATERRA

PretaTerra mostra caminho da viabilidade econômica em projetos de agrofloresta

Empresa promove a coexistência da pecuária com a preservação ambiental, melhorando a produtividade e a qualidade dos produtos agrícolas

Redação

em 23 de outubro de 2023


Fundadora, CTO e diretora de operações da PretaTerra, a engenheira florestal e bióloga Paula Costa acumula uma experiência sólida em agrofloresta. Nessa entrevista, ela comenta como nasceu a empresa e a expansão internacional e orgânica, principalmente por meio de recomendações e indicações de parceiros e clientes satisfeitos.

O networking e as conexões com empresas estrangeiras interessadas em sustentabilidade desempenharam um papel fundamental na expansão da PretaTerra para outros países, como Peru e Indonésia. Participante de alianças e movimentos globais, a empresa criou uma metodologia que mostra como se ter a viabilidade econômica em projetos agroflorestais no Brasil e no exterior.

O que levou à criação da PretaTerra?

Foto: Divulgação

Eu e meu sócio, Valter Ziantoni, somos engenheiros florestais e temos uma trajetória de busca de conhecimento florestal. Quando começamos, o tema estava voltado para pequenas áreas e numa escala de agricultura familiar. Eu tive muita experiência na Amazônia, com pequenos e médios proprietários, com comunidades indígenas. Foi uma época que eu trabalhei muito como extensionista rural. Já o Valter fez o mestrado em sistemas agroflorestais, sobre a Zâmbia. Durante um longo período trabalhamos juntos na Amazônia. Minha carreira esteve fortemente ligada a organizações não governamentais (ONGs) em diversas regiões da Amazônia. Nossa trajetória se cruzou na fazenda da Toca, em Itirapina, interior de São Paulo, uma das pioneiras no Brasil a adotar a lógica de práticas agroflorestais em larga escala.

E então começam a estruturar a atuação?

Começamos a nos aprofundar nessa abordagem, concentrando-nos em traduzir a complexidade do sistema agroflorestal em operações sistematizadas para um planejamento e gestão eficazes. O objetivo era compreender o custo de implementação, o custo anual de cada operação de manejo e a previsão de colheita para cada espécie. Isso nos levou a criar modelos de negócios florestais, um processo que se originou na fazenda da Toca. Nesse ponto, percebemos que havia um mercado em crescimento, uma demanda reprimida que carecia de atendimento. Muitas pessoas entravam em contato com a fazenda da Toca em busca de consultoria e orientação técnica. Começamos a oferecer cursos na fazenda e atender a essa demanda.

A PretaTerra nasceu dessa iniciativa?

Sim. Inspirados por isso, decidimos fundar a nossa empresa. Consolidamos o nosso conhecimento em modelagem financeira de sistemas agroflorestais e traduzimos a complexidade do sistema agrícola e florestal em planos de negócios viáveis. Inicialmente, nossos clientes eram pequenos e médios proprietários de terras, incluindo herdeiros de terras recentemente adquiridas. Com o tempo, começamos a trabalhar com grandes investidores e empresas de maior porte. Hoje, nosso foco principal é atender “offtakers”, que são empresas que compram produtos agroflorestais e desejam que seus fornecedores adotem práticas de produção mais sustentáveis, como agrofloresta e agricultura regenerativa.

E como fica a viabilidade econômica dos projetos?

Foto: Divulgação

Nós estruturamos o processo e, uma das áreas-chave, é a viabilidade econômica. Acredito que esse seja um dos aspectos mais cruciais e as pessoas muitas vezes não compreendem como gerenciar um sistema tão complexo. Essa questão pode ser dividida em duas partes: planejamento em si e viabilidade econômica. Ao optar por plantar uma monocultura de soja, por exemplo, você tem um pacote tecnológico bem definido, incluindo informações sobre quando plantar, quais insumos usar, quando aplicar medidas fitossanitárias e quais são as expectativas de colheita. Além disso, a logística de acesso ao mercado é mais previsível.

No entanto, ao adotar a agrofloresta, você lida com uma complexidade maior. É preciso escolher as espécies a serem cultivadas, organizar seu plantio no espaço e no tempo, planejar todos os manejos necessários e lidar com um conjunto diversificado de culturas. Além disso, deve-se considerar a densidade de plantas por hectare, o que torna as decisões ainda mais complexas. Em resumo, planejar é o primeiro passo para estabelecer um sistema agroflorestal que seja sustentável, com início, meio e fim bem definidos.

E a parte financeira?

Nossa modelagem financeira é fundamental nesse processo, e ela se baseia em premissas como os preços de mercado, custos de insumos, despesas operacionais e muito mais. Essas premissas refletem o cenário atual, e usamos as informações para criar uma modelagem que permita ao agricultor entender se seu sistema será viável financeiramente.

É fundamental que as contas fechem, para que o agricultor saiba onde fazer ajustes, aprimorar as operações e garantir que o sistema funcione de maneira eficiente. A competição com a monocultura é desafiadora, pois a agrofloresta exige aprendizados constantes e adaptações. Cada sistema é único e a busca por otimização é constante.

Como hub agroflorestal, vocês têm parceiros…

Temos uma equipe multidisciplinar de profissionais que atuam em cada projeto, abrangendo áreas como agronomia, silvicultura, solos, clima e mapeamento. A seleção desses profissionais varia de acordo com a escala e a complexidade do projeto. Além disso, estabelecemos conexões com fornecedores de mudas, sementes e insumos, bem como parceiros locais para logística e comercialização. Isso é crucial, pois cada projeto é único e requer uma rede complexa de suprimentos. É um trabalho que envolve conectar todos os pontos em uma paisagem para criar um ecossistema de produção eficaz. Portanto, o ‘hub’ de que falamos é uma reunião de profissionais, fornecedores, parceiros e compradores, todos trabalhando juntos para construir e otimizar sistemas agroflorestais na prática.

Há parceiros, fornecedores críticos nesse ecossistema?

Isso pode variar de acordo com a localização. No entanto, em algumas regiões, a obtenção de mudas de espécies específicas pode ser um desafio significativo. Além disso, a aquisição de insumos orgânicos para fertilização pode ser complexa, dada a logística de transporte e o volume de resíduos orgânicos envolvidos. A abordagem de uso de árvores de rápido crescimento como espécies de serviço pode ser útil para melhorar a disponibilidade de nutrientes no solo. É um processo longo, mas pode contribuir para a fertilidade do solo e a fixação de carbono.

E sobre os offtakers?

Eles desempenham um papel importante como financiadores e apoiadores na transição dos agricultores para sistemas mais sustentáveis. Eles permitem que os agricultores iniciem essa transformação com apoio financeiro, capacitando-os e reduzindo os riscos envolvidos na adoção de novos métodos de cultivo. Isso é especialmente crucial, uma vez que a inovação na agricultura é um desafio e envolve riscos.

E como a pecuária entra na adoção de sistemas agroflorestais?

Ela é parte fundamental da equação da agrofloresta. O sistema silvipastoril é uma abordagem inteligente, que combina pastagem e árvores, criando uma simbiose que beneficia tanto o ambiente quanto a produção pecuária. Ele é uma alternativa sustentável à pecuária tradicional, que muitas vezes envolve o confinamento de animais e a alimentação com grãos. O silvipastoril permite que os animais se alimentem de forma mais natural, o que contribui para a saúde e o bem-estar. Outro ganho, em comparação com a pecuária intensiva, é a redução das emissões de carbono. Os animais que se alimentam de pastagens tendem a ter ciclos de vida mais longos e, embora cresçam mais lentamente, a emissão de carbono por quilo de carne é menor. A qualidade de vida deles também é melhor.

E os ganhos da relação entre pastagens e floresta?

As árvores plantadas nas pastagens não apenas fornecem sombra, mas também desempenham um papel fundamental na captura e armazenamento de carbono atmosférico. Isso é benéfico para a mitigação das mudanças climáticas. E podemos ter, falando nesse assunto, produtos florestais. As árvores nas pastagens não precisam ser exclusivamente de sombra e podem ser espécies produtoras de madeira ou outras matérias-primas. Isso gera renda adicional para os produtores. Mais do que isso, destacamos a recuperação de pastagens degradadas, que no Brasil envolve muitas áreas.

A introdução do sistema silvipastoril pode revitalizar essas terras, melhorando a qualidade do solo e aumentando a produtividade. O sistema representa uma abordagem holística para a agropecuária, considerando não apenas a produção de alimentos, mas também a sustentabilidade ambiental e a resiliência diante das mudanças climáticas. É uma solução eficaz para promover a coexistência da pecuária com a preservação ambiental e, ao mesmo tempo, melhorar a produtividade e a qualidade dos produtos agrícolas.