Foto: Christopher Pike/ COP28 via Flickr UNclimatechange
compilado cop 28
Foto: Christopher Pike/ COP28 via Flickr UNclimatechange

COP 28: um compilado dos últimos dias do evento

O Prato do Amanhã lista alguns detalhes desses acontecimentos, colhidos direto da COP 28 pela equipe da Marfrig

Redação

em 14 de dezembro de 2023


Nos últimos dias da COP 28, os assuntos de destaque foram os balanços do global stocktake, preservação da biodiversidade, redução do desmatamento na Amazônia e rastreabilidade, entre outros. O Prato do Amanhã, lista, abaixo, alguns detalhes desses acontecimentos, colhidos Direto da COP 28 pela equipe da Marfrig. Acompanhe.

Empresas assinam Carta Global de Óleo e Gás

O sétimo dia da COP 28, em Dubai, foi dedicado aos temas Ação Multinível, Urbanização, Ambientes Construídos e Transporte, que contaram com várias plenárias e lançamentos ao longo do dia.  

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Foto: Mahmoud Khaled/ COP28 via Flickr COP28 UAE

Um exemplo foi a reunião ministerial sobre urbanização e mudanças climáticas, que contou com várias apresentações de soluções que deram certo nos mais variados lugares e que podem ser adaptadas e multiplicadas. Também foi lançado o “Buildings Breakthrough”, uma plataforma de colaboração internacional para acelerar a ação climática em edificações, liderada pela França e Marrocos, acompanhados por mais de 25 países. 

No entanto, o maior destaque, em termos de lançamento, foi um tema que remete às discussões do dia anterior: energia. A Carta Global de Óleo e Gás, uma iniciativa da Presidência da COP 28, foi assinada por 52 empresas do setor, que se comprometeram em alcançar emissões líquidas zero (net zero) até 2050, o mais tardar. Para 2030, duas metas intermediárias: encerrar a queima de rotina (flare) e zerar as emissões de metano.

Biodiversidade ameaçada

A natureza, a terra e o oceano fornecem alimentos e água e sustentam toda a vida na Terra, além de desempenharem um papel crucial na regulação do clima. No entanto, estão ameaçados pela degradação dos solos e pela poluição dos oceanos. 

O décimo dia da COP 28 foi dedicado ao tema, com debates que buscaram respostas sobre o que precisa ser feito para garantir um futuro no qual a biodiversidade prospere, considerando que a utilização do solo seja sustentável e os oceanos estejam repletos de vida. 

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Foto: Flickr COP28 UAE/Reprodução

Um dos destaques foi a mesa redonda ministerial de alto nível, na qual ministros de vários países discutiram, especialmente, estratégia imediatas e de alto impacto para mitigação, focadas na manutenção da meta de 1,5o C e em meios para garantir acesso à tecnologia e ao financiamento, de forma que as soluções climáticas necessárias possam ser implementadas. 

Já no Painel de Alto Nível sobre os Oceanos, composto por 18 líderes mundiais que representam 50% das costas globais e mais de 45% das Zonas Económicas Exclusivas, foi formalizada a entrada da Organização dos Estados Americanos (OEA) ao grupo. Também houve anúncios de metas de ambição climáticas oceânicas, compromissos e iniciativas de atores não estatais em apoio à conservação marinha, transporte marítimo, energias renováveis, alimentação aquática e turismo costeiro. 

REDD+ 10 anos 

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Foto: Marcos Vicentti/Secom/Governo do Acre

Um evento na Blue Zone celebrou 10 anos de REDD+, trazendo uma visão geral do desenvolvimento da ferramenta ao longo desta década, histórias de sucesso e caminhos para aumentar o desempenho e resultados. 

Desde a criação do REDD+, em 2013, 60 países em desenvolvimento relataram atividades para reduzir o desmatamento e a degradação florestal, cobrindo uma área de cerca de 1,35 mil milhões de hectares – aproximadamente 62% da área florestal nos países em desenvolvimento. Este esforço levou a uma redução significativa nas emissões de dióxido de carbono: 17 países reportaram uma diminuição de 11,6 bilhões de toneladas. 

Rastreabilidade é diferencial competitivo

Raquel Ogando, diretora de Sustentabilidade da BRF, participou, no Pavilhão da Confederação Nacional da Indústria (CNI), na COP 28, em Dubai, do painel “A rastreabilidade da cadeia de valor como diferencial competitivo e ferramenta de compliance socioambiental”. Mediado por Laura Lamonica, gerente executiva da Coalizão Clima e Floresta, a conversa contou com a participação de Fernando Sampaio, diretor de Sustentabilidade da ABIEC (Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes), Fernando Sampaio, e de Roberto Waack, membro do Conselho de Administração da Marfrig. 

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Foto: Approach/Marfrig

O painel foi baseado na necessidade da implantação de um sistema de rastreabilidade do ciclo de vida dos alimentos, especialmente a proteína animal, produzida em ecossistemas sensíveis, como Amazônia e Cerrado, ao longo de toda cadeia de valor. “A nossa cadeia produtiva é um pouco diferente da cadeia da pecuária. A gente trabalha com 10 mil produtores integrados, ou seja, produtores de proteína animal, com contratos de longo prazo. Mas a nossa cadeia, na verdade, começa na compra de grãos, pois temos fábricas de ração. Portanto, quando a gente olha para o início da cadeia, é preciso garantir que esse grão venha de áreas que não sejam áreas de desmatamento e que também estejam em compliance com as legislações sociais, ou seja, livres de situações de trabalho infantil, trabalho escravo.Tudo isso a gente já está rastreando hoje”, explicou Raquel. 

Para ela, a transparência do processo é uma garantia para que a implementação do rastreamento funcione: “A BRF, com uma companhia de capital aberto, está presente em diversos rankings, sendo avaliada por investidores sob esses critérios. Cada vez mais, as perguntas vão ficando mais complexas e a gente vai aprimorando. Temos a missão de garantir a transparência e a governança, por isso investimos bastante nessa frente”.  

Amazônia para além da floresta

O painel “Para além das florestas: sistemas alimentares e agricultura na Amazônia e as soluções climáticas baseadas na natureza”, dentro da programação da COP 28, discutiu a questão das Soluções Baseadas na Natureza (SBN), mas procurou estender o foco para os pequenos produtores agrícolas e pecuários brasileiros, que estão na ponta da cadeia, e cuja integração é imprescindível para a implementação dos sistemas alimentares e agricultura. 

Com mediação de Marcelo Brito, do Consórcio Amazônia Legal, o painel teve participações de Caio Penido, do Instituto Mato-grossense da Carne (IMAC); Paulo Pianez, diretor de Sustentabilidade, Inclusão Social e Comunicação na Marfrig; e de Ludmila Rattis, pesquisadora do Ipam e professora na Fundação Dom Cabral.   

Marcelo Brito relembrou que se busca, cada vez mais, mostrar e exemplificar que a Amazônia não é um “bloco monolítico” e que é importante mostrar e falar das muitas Amazônias para o mundo. “Não podemos falar mais de uma Amazônia sem pensar em pecuária e agricultura. São atividades que precisam ser debatidas, em busca de uma maturidade, numa discussão que possa colocar o Brasil, definitivamente, na agenda mundial”, alertou.  

Ludmila Rattis apresentou pontos de uma pesquisa que mostra que áreas da Amazônia e Cerrado estão climaticamente menos estáveis e mais abandonadas. “Foram mapeadas áreas da safra e safrinha do milho, que se apresentaram instáveis, com quedas de produção. Notou-se, também, que há áreas onde a seca está aumentando mais que em outras. E também que, em anos em que ocorre o fenômeno El Niño, a produção é menor. Em 2023, a safra de soja, no Mato Grosso, precisou ser colhida bem antes do prazo”, detalhou.  

O pecuarista Caio Penido disse que o esforço de aliar pecuária e sustentabilidade para produzir carne de qualidade na Amazônia é constante e antigo na Agropecuária Água Viva, na qual é sócio-diretor. Em 2015, ele criou o programa Carbono Amazônia para regular as emissões do ano de 2016. Penido falou sobre a questão da rastreabilidade, que passou a ser uma exigência nas exportações de carne brasileira à China. “A rastreabilidade deve alcançar desde a primeira movimentação e muito dessa cadeia está com os pequenos produtores ou ocupantes de assentamentos. Precisamos dar condições de que essa ponta seja atingida e regularizada, para que eles tenham acessos aos serviços ambientais, estimulando a agenda corretamente para que, assim, esse produtor se fixe no campo”.  

A Marfrig atua em 100 países, sendo a segunda maior empresa de produção de proteína animal e a oitava empresa privada do Brasil, com cerca de 130 mil colaboradores, sendo que 70% do que produz estão voltados para exportação. É uma empresa gigante e, por isso, aliar a pressão dos investidores e mercado, conciliando produção com conservação, é o grande desafio da empresa.  

“De 2 a 2,5 milhões de produtores pecuários no Brasil, 70% são de pequenos produtores. Nosso desafio é viabilizar que essa agricultura possa ser inserida nos programas alimentares, que representam geração de renda. Eles precisam ter acesso a assistência técnica e tecnologia, sem exclusão. É possível uma pecuária de baixo carbono, mas é necessário estabelecer condições de que ela se transforme em realidade”, enfatizou Paulo Pianez.  

“Quem fala da Amazônia sem agropecuária, não conhece a realidade da produção na região. O que se quer é um entendimento das pontas, em uma produção aliada com a conservação, para que os sistemas alimentares sejam transformados”, continuou.  

Uma novidade que surgiu recentemente na Europa – e com grande alarde e marketing – é a “carne gourmet”, que é proveniente da criação do boi no pasto, técnica que é muito utilizada no Brasil. “Na verdade, no Brasil, estamos saindo da criação ‘a pasto’, para o confinamento, mas ainda temos 80% da criação da técnica tradicional por aqui”, explicou Caio Penido.  

Para Paulo, o manejo adequado é muito importante. “O importante é manejar melhor as pastagens, além de também fixar fósforo e nitrogênio no solo. Com manejo adequado, teremos aumento de produtividade, recuperação de biodiversidade, em busca da restauração ecológica, sendo que é preciso que o setor financeiro saia da caixa para viabilizar essa transformação. Os bancos chegaram um pouco atrasados na agenda, mas têm condições de se recuperar”, aconselhou Pianez.  

Sobre a COP 30, no Brasil, Paulo Pianez se preocupa com a questão da rastreabilidade. “Temos dois anos para tornar a rastreabilidade um fator concreto. Seria muito decepcionante ter a Conferência do Clima no Brasil sem que essa questão estivesse totalmente abarcada, sem que nós tenhamos controle total do desmatamento. Mas, estou otimista”, aposta.  

Encerrando o painel, os palestrantes concordaram que a COP 30, em Belém, na Amazônia, mesmo passando pelo Azerbaijão em 2024, será a “COP das Pessoas”, que buscará a construção de pontes, de aproximação das pessoas, com a promoção de diálogos sobre a COP da Natureza.  

Estratégia de descarbonização na indústria alimentar 

A diretora de sustentabilidade da BRF, Raquel Ogando, participou do painel “Estratégia de descarbonização na indústria alimentar”. O evento fez parte da programação do Hub Amazônia, pavilhão que congrega os estados da Amazônia Legal, na COP 28, em Dubai. 

Foto: Approach/Marfrig

A conversa foi mediada por Felipe Bittencourt, CEO da Waycarbon, e contou com a participação da BRF, representada por Raquel; de Carolina Carregaro, da Nestlé; e de Orlando Nastri, da Citrosuco. Cada uma das empresas teve a oportunidade de contar como vem atuando para descarbonizar sua cadeia de valor e como pretende chegar ao net zero. 

Na sua apresentação, Raquel afirmou que a inovação e a colaboração com o ecossistema de negócios estão entre as apostas principais da indústria e também da BRF: “Temos trabalhado nossas pesquisas e desenvolvimento (P&D) em parceria com nossos fornecedores. A BRF tem uma meta de ter 100% de suas embalagens recicláveis e estamos contando com a ajuda dos fornecedores desse produto para chegar lá. A gente precisa ter parceiros que tragam conhecimento e nos ajudem a ir mais rápido em projetos que começam como piloto, passando, depois, à grande escala”. 

Outro ponto importante da estratégia da BRF, segundo Raquel, é a redução do desperdício dos alimentos. “Um dos exemplos de como temos atuado nessa frente está relacionado com o Instituto BRF. O instituto lançou o desafio para o desenvolvimento de soluções tecnológicas para reduzir desperdício. Um desses projetos foi escolhido para ser acelerado. Trata-se da Lemon, uma startup que trabalha com tecnologia para gestão de estoques e capacitação de merendeiras em escolas públicas. Fizemos um piloto em Dourados (MS) e vimos, com quatro meses de projeto, uma redução de 65% do desperdício de alimentos nas escolas municipais da cidade. Depois, conseguimos escalar isso em um aplicativo, que hoje já tem uma versão aberta para todas as escolas públicas no Brasil”, contou Raquel. 

Os comitês de impacto social da BRF, presentes em cada uma das unidades da empresa, ajudaram a apresentar a ferramenta às escolas. “O ganho de escala também vem por meio da nossa capacidade de conectar e de comunicar isso. Como é que a gente, como organização, consegue ir fazendo essas pontes e trazendo esses elos para que as soluções que estão disponíveis sejam acessadas e viabilizadas em nível municipal, por exemplo? É lá que as políticas públicas precisam melhorar mais urgentemente”, explicou Raquel. 

Água, alimentos, agricultura 

Foto: Flickr COP28 UAE/Reprodução

O antepenúltimo dia da COP teve como temática a “Água, Alimentação e Agricultura”. Os sistemas alimentares são essenciais para a saúde e a subsistência das comunidades e também são fortemente afetados pelas mudanças climáticas. Tais sistemas são responsáveis por cerca de 30% das emissões globais, número que deve crescer acompanhando o aumento da população mundial. Até 2030, o total de terras agrícolas deve aumentar cerca de 10%, pressionando ecossistemas e aumentando o potencial de desmatamento. 

As mudanças climáticas também têm impacto nos usos e na disponibilidade da água, um dos pontos em que as pessoas sentem, de forma mais intensa e frequente, os efeitos das alterações no clima. Com o aumento da temperatura média da Terra, as secas devem se tornar mais comuns, graves e longas.  

Os sistemas alimentares devem aprimorar o uso dos solos e da água para atingir emissões líquidas zero e, ao mesmo tempo, restaurar a natureza, melhorar os meios de subsistência e aumentar a resiliência climática. 

Entre os acontecimentos relacionados a estes temas na COP 28, listamos a seguir alguns destaques.

  • Mais de 130 países assinaram, comprometendo-se a adaptar e transformar os sistemas alimentares e a incluir metas alimentares e de uso da terra nas suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) e Planos Nacionais de Adaptação (PAN), até 2025.  
  • Uma coligação de 200 grupos de agricultores, comunidades, empresas, organizações filantrópicas e cidades assinou o Apelo à Ação dos Atores Não Estatais para a Transformação dos Sistemas Alimentares para as Pessoas, a Natureza e o Clima, com o objetivo de apoiar e complementar a Declaração sobre Agricultura Sustentável, Sistemas Alimentares Resilientes e Ação Climática, reforçando o papel dos governos na transformação dos sistemas alimentares. Os signatários, incluindo C40 Cities, a Organização Mundial de Agricultores, a Nestlé, o World Wildlife Fund e o Bezos Earth Fund, também se comprometeram com ações como o apoio aos intervenientes da linha da frente do sistema alimentar e o respeito pelos direitos dos povos indígenas, ao fazerem investimentos no sistema alimentar. 
  • As principais organizações alimentares e agrícolas comprometeram-se a estabelecer parcerias com 3,6 milhões de agricultores para acelerar a regeneração de mais de 160 milhões de hectares, com um investimento inicial de 2,2 bilhões de dólares. A agricultura regenerativa envolve práticas como culturas de cobertura, rotação de culturas e redução do uso de produtos químicos para promover sistemas agrícolas mais resilientes.  
  • Governos nacionais, Banco Mundial e Fundação Gates se comprometeram com um total de 890 milhões de dólares ao Grupo Consultivo sobre Investigação Agrícola Internacional (CGIAR), uma rede financiada de forma pública. O financiamento será utilizado para apoiar os pequenos agricultores em pesquisas sobre tecnologias e técnicas que constroem sistemas alimentares resilientes e sustentáveis, incluindo novas variedades de culturas e técnicas de gestão de terras. 
  • A Dairy Methane Alliance foi lançada por seis grandes empresas alimentares, incluindo Kraft, Heinz e Nestlé, em parceria com o Fundo de Defesa Ambiental. Os signatários comprometeram-se a divulgar as emissões da produção de laticínios e a lançar um plano de ação público até 2024 para reduzir as emissões de metano nas suas cadeias de abastecimento. As empresas representam mais de 200 bilhões de dólares em vendas globais. A pecuária é responsável por mais de 30% das emissões antropogênicas globais de metano. 
  • Mais de 30 países, incluindo o Brasil, aderiram ao Desafio da Água Doce, um compromisso de estabelecer metas para preservar os ecossistemas de água doce e incluí-los nas suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs). 
  • A Iniciativa Catalisadora da Água Urbana (UWCI) foi lançada no período que antecedeu a COP 28, na Conferência da Água de 2023, da ONU. O objetivo é apoiar os serviços de abastecimento de água, garantir o acesso e melhorar os serviços de saneamento nas zonas urbanas. O tema contou com uma sessão de trabalho na COP para seu detalhamento. 

Novo texto do Global Stocktake é criticado

Foto: Flickr COP28 UAE/Reprodução

O presidente da COP 28, Al Jaber, abriu a primeira parte da sessão plenária afirmando que “o momento para decisões é agora”. No entanto, o que se viu durante o décimo segundo dia de evento foi uma COP em compasso de espera. Todas as discussões, exceto as do Artigo 6 do Acordo de Paris, passaram a ser feitas em reuniões de portas fechadas, o que fez com que a maioria dos envolvidos e observadores não pudesse fazer muito mais do que esperar as novas versões dos textos.  

As conversações estão sendo conduzidas pela Presidência, pelos ministros co-facilitadores nomeados no início da semana, pelo Secretário Executivo da UNFCCC, Simon Stiell, e pelo Secretário-Geral da ONU, António Guterres, que regressou ao Dubai.  

As reações ao rascunho do Balanço Global (Global Stocktake) foram velozes e furiosas. A expectativa de que o texto apelasse à eliminação ou redução progressiva dos combustíveis fósseis foi frustrada. Ele sugere, em vez disso, uma longa lista de ações que os países “poderiam” realizar, como limitações na geração de energia a carvão; avanço das tecnologias de redução e remoção; e redução do consumo e a produção de combustíveis fósseis, para atingir o net zero “até antes, ou por volta de 2050”. Diante da falta de firmeza do texto, ministros de países desenvolvidos e em desenvolvimento afirmaram que o documento fica “aquém, muito aquém” do que poderiam aceitar, indicando a necessidade de uma nova versão. 

Com o lento avanço das negociações e a percepção de que alguns acordos vão ficar bem longe do ideal, cresce a percepção de que outros atores – como empresas, organizações da sociedade civil e governos subnacionais – terão seus papéis aumentados nas demandas por mitigação e adaptação às mudanças do clima. 

Painel Marfrig

O Governo do Brasil instituiu, em junho deste ano, o Programa Nacional de Conversão de Pastagens Degradadas em Sistemas de Produção Agropecuários e Florestais Sustentáveis (PNCPD), criando em seguida seu Comitê Gestor Interministerial.  

Foto: Reprodução/Ministério da Agricultura e Pecuária

Na manhã do penúltimo dia de evento, dentro da programação da COP 28 em Dubai, Roberto Perosa, secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), mediou um painel e apresentou o Programa, com a participação de Grazielle Parenti, head business and sustainability da Syngenta; Paulo Pianez, diretor de Sustentabilidade e Comunicação da Marfrig; Liege Correia, diretora de sustentabilidade da JBS; e Jorge Gildi, especialista em Finanças Sustentáveis do Banco do Brasil.  

O Programa 

A reabilitação de pastagens degradadas objetiva tornar terras que perderam vitalidade em áreas agricultáveis de alto rendimento, ao mesmo tempo em que se reduz o desmatamento de áreas de vegetação natural. O foco são os pequenos e médios produtores rurais, levando desenvolvimento ao interior do Brasil.   

O Brasil possui 851 milhões de hectares, dos quais 584 milhões – 66% – são de florestas nativas e 159 milhões, ou 18,6%, destinados a pastagens. Essas áreas de pastagens foram mapeadas, identificando-se 40 milhões de hectares com alto potencial para atividades agrícolas.  

O Programa Nacional de Conversão de Pastagens Degradadas em Sistemas de Produção Agropecuários e Florestais Sustentáveis integra o Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), e o Governo Federal, por meio do Mapa, apresentou a iniciativa, que busca a colaboração entre os setores público e privado, objetivando revitalizar os 40 milhões de hectares de pastagens degradadas, ao longo dos próximos 10 anos.  

Foto: KÖPP, Maurício/Embrapa

Estima-se no Programa um custo entre 1.500 e 3 mil dólares, por hectare, no que representa oportunidades de investimentos de até 120 bilhões de dólares. 

“O investimento se volta à recuperação das pastagens, incluindo correção de solos, aquisição de maquinário moderno, implementação de sistemas agrícolas ambientalmente responsáveis e apoio a despesas operacionais. A recuperação e conversão de pastagens vai poder, praticamente, dobrar a área de produção de alimentos no Brasil, sem desmatamento”, explicou Roberto Perosa, que destacou, com ênfase, o trabalho de pesquisa da Embrapa. Outro apoio decisivo é do Banco do Brasil, na área de financiamentos.  

As pesquisas da Embrapa mostraram um crescimento de 140% de área plantada em 50 anos, com um índice de produtividade de 600%, crescimento de tecnologia e mais capacidade de produção, em menos áreas. Ainda na pesquisa, a Embrapa mostra que as áreas que se adequam ao Programa se localizam na região Centro-Sul do Brasil.   

O financiamento esbarra em captação de recursos externos, alertou Jorge Gildi, do Banco do Brasil. “A captação de recursos externos esbarra no câmbio, que é um complicador para operações de longo prazo”, explicou. O Banco do Brasil fez um mapeamento de onde estão esses produtores, considerando 190 mil agricultores em 170 mil fazendas.  

Paulo Pianez festejou o lançamento do PNCPD pelo Governo Federal e mostrou que a Marfrig lançou em 2020 o Programa Verde+, que está em consonância com essa iniciativa federal. No segundo dia da COP 28, a Marfrig apresentou a segunda parte desse programa, no qual, a empresa investirá R$ 100 milhões para acelerar a iniciativa e se compromete a controlar 100% de sua cadeia de fornecimento de gado, direta e indireta, até 2025, antecipando a meta inicial de 2030. 

Para acelerar o Programa Verde+ nos próximos anos, a companhia vai implementar uma série de ações: recuperação e transformação de 100 mil hectares de pastagens degradadas em áreas produtivas; restauração ecológica de cerca de 6 mil hectares de florestas nativas restauradas; agropecuária regenerativa, com intensificação e manejo adequado de pastagens e aumento da produtividade; melhoria genética do rebanho com integração; tecnologias de medição de carbono no solo e geração de créditos de carbono certificados; carne baixo carbono e carne carbono neutro certificadas; proteção à biodiversidade, com resgate e reabilitação de animais silvestres no Pantanal, em especial, as onças, e apoio a pequenos produtores de cria, com investimento no Programa de Produção Sustentável de Bezerros da IDH, no Norte do Mato Grosso. 

“O que buscamos na Marfrig é combater essa ‘política de exclusão’, porque é comum ver que se um produtor – em sua maioria, um pequeno produtor –, tiver algum problema, ele poderá ser impedido de vender às grandes empresas. O que queremos é que esse produtor continue na cadeia de fornecimento da Marfrig”, explicou Pianez.  

Ainda nas parcerias no segmento de restauração ecológica, Pianez citou a criação da Biomas, empresa brasileira que objetiva restaurar, conservar e preservar 4 milhões de hectares de terra em 20 anos, e é integrada pela Marfrig, Itaú, Vale, Rabobank, Santander e Suzano.  

“É reconfortante ver que ações diretas praticadas pela Marfrig estão alinhadas com os objetivos do Programa, que se apresenta, agora, estruturado. Espero que o setor escale mais e mais, e que a chegue à ponta, onde está produtor, e tudo aliado à conservação”, observou.  

Liege Correia apresentou os “escritórios verdes” da JBS, programa que contribui para a inclusão de produtores e regularização ambiental de propriedades, desenvolvendo uma pecuária sustentável. “Começamos com três escritórios, passamos a dez e logo estávamos com 20. Em dois anos dessa iniciativa, já temos sete mil propriedades regularizadas”, explicou. Liege também falou sobre um programa da empresa que atuará junto a 1.500 famílias no Pará, apoiando o SAF (Sistema Agroflorestal) de cacau e a pecuária em assentamentos.  

Já Grazielle Parenti mostrou o programa Reverte, iniciativa da Syngenta, que tem a meta de recuperação de 1 milhão de hectares até 2030. “A ideia é permitir que produtores expandam suas lavouras sem degradar o solo, demonstrando a viabilidade econômica de recuperar terras, ao invés de abrir novas áreas para plantar, preservando a vegetação nativa”, apontou.  

O PNCPD apoiará, exclusivamente, empreendimentos que estejam inscritos no Cadastro Ambiental Rural (CAR) e que no prazo de dez anos, contado da data de ingresso no Programa, entre outros pontos, reduzam as suas emissões.